Dear White People | Séries

Falar das primeiras impressões sem spoilers de Dear White People eu falei nesse post aqui. 

Então hoje eu vou me ater aos detalhes que me fazem gostar tanto dessa série.


E depois de ver muitos/poucos reviews eu preciso relatar que não é uma série perfeita. Tem sua parte de esquisitices que convém qualquer série, mas como eu no primeiro momento vi apenas o meu contentamento em me ver na televisão eu não tinha prestado tanta atenção para falar sobre, mas depois de ver mais uma vez e refletir sobre os comentários negativos e positivos eu cheguei à conclusão que ainda é melhor do que 90% das coisas que eu sou obrigada a assistir por falta de melhor opção.
Vamos lá, começando pelas escolhas que eu imagino serem as primeiras quando você idealiza uma série.
Dez episódios foi pouco pra mim, mas perfeito para uma série de caráter tão questionador, e tão polêmica quanto se propôs ser desde eu título. E trinta minutos são mais que suficiente para contar a história de um recorte específico de um momento que dura poucos dias.
A explicação do porque é necessário um narrador "de voz étnica mas pacífica" me ganhou já de cara.
Mas aí eles vêm com uma série de acontecimentos numa avalanche. E nos episódios seguintes é que você vai juntando o quebra cabeça de informações com pontos de vista dos personagens principais de um modo muito coerente, falando pouco de cada um, deixando as ações falarem por si. Não existe muito backstory, o máximo contado do passado foi a história da Coco. E nessa, eu pensei que eu ia chorar. Porque é diferente ver o pessoal sofrendo um racismo velado na faculdade, onde eles estão crescidos e já mais calejados. Quando mostra a Colandrea criança sendo diminuída por outras crianças, eu pelo menos voltei alguns estágios na terapia. Porque lembrar que crianças são cruéis e preconceituosas, mesmos elas sendo na mesma situação que você é dar um tiro na sua esperança de futuros melhores.
A história também um pouco mais elaborada é o do Lionel, que conta como é difícil ser nem que seja um mínimo diferente do padrão masculinizado ao extremo na comunidade negra.
Isso não é uma coisa muito difícil de entender, já que existem tantos relatos do sofrimento de jovens gays, mas contar o agravante de ser negro e gay num ambiente ainda mais machista é algo que antes eu nunca tinha visto. Vi agora, com Moonlight. Relembrando o quanto é mais "fácil" ser homossexual num ambiente branco, porque representatividade e liberdade sexual são coisas tão longe umas das outras quando se vê com recorte social que eu não consigo lembrar de nenhuma outro personagem gay e negro em relacionamentos amorosos, mesmo que eu seja uma grande consumidora de ficção diversificada. Vários porquês para isso, e eu gostaria que isso fosse mais abordado.
Aliás, como uma própria fala de Dear, não temos muita opção em representatividade, quanto mais passar visões de relacionamentos amorosos:

Achei um link ótimo, porém em inglês falando sobre o porque de brasileiros se verem tanto no seriado da Netflix mesmo não sendo dois países culturalmente próximos. E tem listinha de assuntos que ambas as comunidades negras respectivas enfrentam.
Os assuntos abordados que podem e devem ser ainda mais aprofundados, apontados no texto acima:

  • Racismo estrutural
  • Solidão da mulher negra
  • Pigmentocracia (famoso colorismo)
  • Estética negra
  • Violência policial
  • Apropriação cultural
  • Estética Empoderada
  • Militância e coletivos
  • Mito do racismo reverso
  • Relacionamentos interraciais
  • A síndrome do impostor vs vitimismo

Esse último versus eu ponho como uma a adição minha porque é algo comum você se deparar com essa palavra em discussões, principalmente na internet, e é importante falar sobre o Troy e sobre como o esforço para ser aceito no espaço branco, que o pai dele também faz e o força a manter é diretamente ligado à essa ideia de que os negros estão "se achando no direito de sofrer agora", "porque antes não existia isso", geração vitimista e aquela balela infantilizada de sempre que os brancos, ou mesmo os negros "not woke"
falam e agravam a ideia de que negros são inferiores e que nada que eles façam será relevante. Como se a validade do que ele diz só o tornasse bom o suficiente se isso servir aos propósitos de manter os privilégios já estabelecidos ao mesmo tempo em que continuam a pregar a meritocracia. Vemos isso também na personagem que trabalha no jornal (Brooke se não me engano) da qual profere, como se fosse algo bom, que ela trabalharia feliz sem dormir para alcançar a meta se fosse necessário.
É complicado querer mais do Troy para a segunda temporada, eu mesma não passei a gostar mais dele ao longo dos episódios. Eu sinto pena, mas não é como eu entendi as ações da Sam, ou da Coco, ou do Reggie. Mas as pontas soltas desse personagem me deixam com vontade de ver mais sobre ele na próxima temporada. Se possível, também pondo em pauta o fato dele ter assumido um relacionamento com a Sam, mas com a Coco não, e isso também ser uma causa para rivalidade feminina dentro da questão colorismo mesmo que o homem da relação não tenha preferido uma branca.
Ah, e o defeito também foi aquela relação esquisita (pranãodizerescrota) foi a relação dele com a professora quase casada com uma mulher, que não trouxe nada à narrativa a não ser pintar homossexuais como promíscuos não confiáveis.
O que é algo que eu não nego também é que a série deixou a desejar entre a química entre os relacionamentos amorosos. Tanto que na torcida, estou com algumas pessoas que torcem por Samandrea <3.

Mais as questões a serem abordadas na segunda temporada:

Quais serão as consequências do "vandalismo" do Troy, o pai dele mudará com ele, como isso vai afetar o futuro programado e brilhante dele?
E claro, quero paralelos sobre como a besteira na vida de um negro é carregada a vida inteira e no de um branco, "ele foi apenas imaturo".
Silvio e Lionel vão ficar juntos mesmo? Não dá pra negar que a química deles é controversa, você não shippa porque eles combinam e se dão bem, é mais porque não queremos ver mais o Lionel sozinho sofrendo por um hétero.
Reggie e Joelle vão dar certo? Mais importante que isso, vamos ver o episódio da Joelle, onde ela fala sobre ser uma pessoa retinta E fora de padrões; não mostra quase nada do corpo da Jo, mas ela claramente abusa da comida numa das primeiras aparições, e eu queria tanto que focassem nessa parte da vida de uma mulher negra... Não só a solidão da mulher negra que se rende aos "padrões" como a Colandrea, mas como a falta de estima da mulher negra afeta diretamente a saúde das que não estão dispostas a seguir dietas, cabelos lisos, famoso "obedeça pra não sofrer mais que o necessário".
"Às vezes ser um negro despreocupado também é um ato de revolução." Melhor quote.
Como fica Coco e Sam, elas vão se juntar pelo bem comum da Armstrong-Parker?
E isso vai junto com outra questão:  Sam vai mudar o discurso depois de ficar presa entre a falta de resultados e o deboche do Pastiche? É tão claro o cansaço dela nas últimas cenas, depois do fiasco em chamar a atenção dos alunos para os problemas raciais da faculdade e o relacionamento com o branco azedo versão gourmet... (mil vezes um episódio da Joelle do que o dele, embora eu tenha dado altas gaitadas com a imaginação dele em preto e branco como um filme do Godard).
Eu não gostaria que o ativismo dela mudasse, mas eu sinto que vai, pois como em todo movimento que não obtém resultados, a tendência é que o sentimento de mudança esmaeça; e é triste porque a Coco também não está atrás depois do balde de água fria em todo aquele discurso dela de mudar as coisas de dentro sendo que agora todos sabem que os Hancocks podem fazer tudo que eles quiserem mesmo que não seja necessário para a Universidade como um todo, mas apenas para manter o controle; e mesmo sem necessidade estão dispostos a segregar a comunidade negra a força assim como os antepassados fizeram.
A gente entende/passa a entender a "política" da Coco.
Vai haver alguma reviravolta e o guarda da faculdade será punido? Ou será que é mais provável os brancos ricos (Hancocks) fecharem o The Independent e/ou Armstrong-Parker?

Tudo isso e mais apenas no próximo ano. E nos próximos posts que ainda vou fazer até lá.
Sério, essa série dá tanto assunto que não dava pra me forcar apenas em uma coisa enquanto escrevo, então vou subdividindo em assuntos específicos e dar a série como exemplos que estará melhor organizado.

Vou tentar suprir a carência de bons textões sobre a série, aqueles que nós não vimos.

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