Fenômeno Mamonas Assassinas | Satirismo x Ser Satírico


Todo ano existe um fenômeno na internet.
E todos os anos eu questiono a capacidade de interpretação das pessoas;
O fenômeno "Aniversário da morte dos Mamonas Assassinas".


(Não que eu não faça isso diariamente. Mas em momentos como esse eu fico com raiva de ter que escutar/ler gente idiota que se acha inteligente. Outra coisa que eu fico sempre, btw. 
Antes de começar, saiba que eu queria muito não ter que identificar as pessoas como de direita ou de esquerda, afinal, acredito que existam pessoas confusas com relação a suas convicções ou só não tem estudo suficiente pra saírem da sua bolha, estudarem e finalmente se identificarem com o esquerdismo social.)(cuidado, esse texto terá muitas verdades que você não quer saber mas deveria. E um monte de aspas porque não né... interfalas)



A internet se divide em duas partes. As pessoas que sentem a maior saudade de um tempo que nem viveram (no qual eu me incluo, pois nasci pouco antes da banda estourar, e eles morreram faz 22 anos), e uma parte das pessoas que nem entendem o momento atual e nem entenderam o que foi o Mamonas Assassinas na época deles. Deve ter uma parcela de gente mais antenada que entendeu as letras e que viveu na época... mas ela não aparece muito na internet, então não entra nesse contexto de pesquisa.


Uns meses atrás meu pai me mostrou um vídeo que ele achou muito engraçado e que ele, percebendo que "eu estava levando as coisas a sério demais" tentou me mostrar pra "levar a vida mais leve". Era um comediante vestido de pastor falando o óbvio aumentado (como é o trabalho dele, stand up é isso mesmo). Mas falando sobre algo que ele obviamente não entendia bulhufas. Falava sobre gênero e as discussões de gênero que existem hoje e que "não existiam antes".

Então eu me proponho a dizer, com todo o meu mal humor, que isso me irrita.
E não é pelo "fazer piadas com coisas sérias". Não, eu nem sou esse tipo de pessoa. É sobre a necessidade de se falar de algo, e se achar no direito de fazer piada, com o que não entende.
Veja, eu não queria uma pessoa formada, sexóloga, entendida, ou uma pessoa trans, pan, etc, pra poder fazer piada sobre sexualidade. Qualquer pessoa com vivência maior do que a heterossexualidade compulsória saberia falar com mais diversidade. Mas não... Eu vi pelas repetições de palavras, jargões e falta de intenção crítica que a pessoa estava falando algo que ela concordava, que tinha escutado a vida inteira, que repetia, de alguma autoridade as opiniões, e nem o personagem de religioso tirava gosto ruim de falta de tato, ou falta de conhecimento de contexto e a falta de empatia com o outro do assunto em questão. Ou seja, o tal comediante apenas reforçava o esteriótipo do religioso ao mesmo tempo que ria de uma discussão que está em voga e faz parte, diariamente, do sofrimento de muita gente.
Não existe graça no que é um confirmação do imaginário comum. Eu só vejo graça na quebra de expectativa do tradicionalismo.
E não é sobre as ofensas; é sobre uma piada burra. Sem imaginação, sem criatividade, sem genialidade, sem identidade.


Eu escutava Mamonas Assassinas por volta dos 12, 13 anos. Até hoje treino trava línguas com eles, só pra dar uma aprimorada no meu jeito (natural) de falar rápido. Na época eu não era muito preocupada com desconstrução de pensamento e comportamento, mas sabia o que era certo e o que era errado, e principalmente o que uma obra subversiva como o CD do Mamonas não era pra ser levada a sério. Era um CD de piadas. Era comédia. Mas eu escuto o Dinho falando sobre violência doméstica, sobre homossexualidade, sobre retirantes, sobre mulheres, sobre zoofilia (alguma semelhança com algo que aconteceu recentemente?!), e percebo o que é crítico, e o que é só "diversão". E diferencio com obras que podem até se assemelhar em questão de linguajar, mas são completamente diferentes em intenção. Eu já até falei disso num texto dramático e estranhamente esclarecedor.

Falar que a "geração mimimi" (e como eu odeio essa expressão, pois é usado pelas pessoas erradas em situações mais absurdas) não aguentaria Mamonas Assassinas sabendo que a poucos meses atrás fecharam uma exposição de artes porque as pessoas não aguentam que as "mazelas sexuais" de uma sociedade sejam expostas graficamente pode até ser verdade. Mas definitivamente não pelos motivos que as pessoas que acreditam nisso dizem.
Primeiro que normalmente você escuta pessoas de direita falando. Já começa que essas mesmas pessoas não conseguem nem crer em nudez artística sem pensar em pedofilia.
Daí vem dizer que a esquerda deixou o mundo mais chato, sendo que conservadores nem conseguem conceber a ideia de arte contemporânea sem chorar de saudosismo. 
Escutar "gay também é gente" pra vocês já é muito. Mas essa parte pode passar batido pra vocês... e o que custa fazer a comparação com as reais pessoas conservadoras da época, às de agora? O sucesso de M.A. não originou deles, suponho. 

Depois dos primeiros estranhamentos, vem a pior das comparações: é fazer um paralelo entre a música do

"Taca a bebida, depois taca a pica e abandona na rua."


Sim, a música tem muita semelhança com Vira-Vira

"Fui convidado pra uma tal de suruba // Não pude ir, Maria foi no meu lugar // Depois de uma semana, ela voltou pra casa// Toda arregaçada, não podia nem sentar // Quando vi aquilo, fiquei assustado // Maria, chorando, começou a me explicar // Daí então, eu fiquei aliviado // E dei graças a Deus porque ela foi no meu lugar"
A colagem da Eugenia Loli coube tão direitinho abaixo dessa música...

Mas aí é que existe uma leve diferenciação do tom.
E sim, o tom dita tudo.
Primeiramente, vamos nos educar um pouco sobre escrita satirizada:

Fazer sátira contra. Ridicularizar. -> Sátira: composição poética em que se censura ou ironizam os defeitos ou vícios. Caráter irônico ou crítico.
Nós precisamos satirizar o texto, para que o mesmo se torne engraçado.
É nesse tipo de arte que eu sou mais versada atualmente; Sugiro que procurem sobre poesias, cantigas de maldizer e escárnio. Ou sobre paródias, também serve. Procurem saber!

E aí, voltando para as críticas propostas na internet, eu me lembro do que li num tweet que viralizou esses dias. Eu li o original em inglês mas fizeram o favor de viralizar em português também:
Se você já tentou colocar o dedo na bunda de um homem hétero, você sabe que eles entendem o que é consentimento e limites sexuais muito bem. Eles “só ficam confusos” com o nosso corpo.
 Embora quando você procure sobre, olha o que se encontra:



Sim, mas..  Por que quando um cantor de funk canta "a realidade dele" ele é censurado? E o Mamonas é aplaudido?

Porque cantar a realidade, sendo sarcástico tentam, ou faz as pessoas pensaremNaturalizar uma ação criminosa no meio de uma música com a desculpa de "ser a realidade" é doentio.


Por conta do contexto histórico em que vivemos. Hoje podemos olhar pra trás e ver todas as problemáticas. E que bom que isso aconteça;
Porque vemos mudanças boas no mundo apesar de tudo.
Só porque as pessoas não pensavam sobre a arte que elas são obrigadas a consumir indiretamente antes, não significa em nada que elas não devem ser pensadas.
Se as pessoas que escutavam Mamonas não pensavam, primeiramente que as histórias contadas eram erradas, e segundamente, que elas eram críticas sociais fodas... então as pessoas escutavam errado.


Isso me faz pensar que a direita, especialmente os homens, troca satirismo com ser sarcástico.

sa.ti.ris.mo masculino
  1. (medicina) Estado de excitação sexual masculina excessiva.

Principalmente depois de ler esse texto: 10 músicas de MA que seriam censuradas hoje.

Mostra que eles são capazes sim de entender e analisar as letras, apenas "ficam confusos" na interpretação quando as críticas são para eles.

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